Nesta edição falamos sobre o trabalho e os dados da plataforma SlaveVoyages, que tem prestado um importante serviço para quem pesquisa e estuda a história da escravidão transatlantica. Você vai conferir uma análise sobre o tráfico de pessoas escravizadas no Brasil e uma entrevista inédita para conhecer melhor o projeto, além das nossas dicas e novidades. Boa leitura!
📊 Uma boa pergunta
Quantas pessoas escravizadas desembarcaram no Brasil ao longo da história?
A escravidão marcou três séculos como a época mais trágica da história do Brasil, deixando profundas marcas na sociedade brasileira, com impactos que repercutem até hoje. Afinal, mais de 3 milhões de pessoas foram trazidas ao país contra sua vontade e em condições desumanas, ao longo de aproximadamente 9,3 mil viagens.
A plataforma SlaveVoyages, projeto colaborativo que reúne informações sobre o comércio transatlântico de pessoas cativas, tem prestado um importante serviço para quem busca entender e estudar a história da escravidão. Ao organizar uma base de dados abrangente e acessível para pesquisadores, educadores e o público em geral, a plataforma se tornou uma das principais fontes de consulta sobre o tema. Ela compila desde arquivos de viagens de embarcações envolvidas no tráfico de pessoas escravizadas até seus diários de bordo.
Agora você também pode acessar esses dados já tratados e prontos para sua análise pela BD. São informações que podem ajudar a desvendar tendências no comércio de pessoas escravizadas e entender melhor o impacto dessa atividade na sociedade e na economia. Você pode explorar, por exemplo, a origem das embarcações, a bandeira sob a qual navegaram pelo oceano atlântico e muito mais. Confira por aqui.
Para demonstrar algumas das possibilidades de análise com esses dados, observamos a chegada de embarcações do tráfico de pessoas cativas no Brasil ao longo da impressionante cobertura temporal de 1500 até 1850. Também foi possível contemplar as regiões brasileiras por onde chegaram as pessoas escravizadas.
Como é possível ver na imagem acima, a chegada das primeiras pessoas escravizadas no Brasil ocorreu em meados do século XVI. No entanto, foi a partir do século XVII que as viagens transatlânticas da escravidão se intensificaram e o país se tornou o maior receptor da América, com a chegada de aproximadamente 230 mil pessoas cativas nesse período. O maior fluxo de viagens ocorreu no século XVIII, quando a produção de açúcar e posteriormente de café se expandiu, aumentando a demanda por mão-de-obra escrava. Nesse século, foram mais de 1,4 milhões de pessoas cativas chegando no país.
Em 1807, o Reino Unido proibiu a atividade, o que foi seguido por outros países europeus e, em 1850, finalmente o tráfico de escravizados foi oficialmente proibido no Brasil. Mas vale lembrar que a escravidão só foi abolida em 1888, após décadas de luta e resistência da população escravizada.
Na imagem acima podemos observar que a maioria das pessoas escravizadas chegaram no Brasil pela região nordeste, que recebeu 57,2% do total dos desembarques registrados, mais de 1,7 milhões de pessoas em aproximadamente 5,9 mil viagens. A região sudeste também recebeu uma quantidade muito grande de pessoas cativas, contabilizando 41,1% dos registros, que apontam mais de 1,2 milhões de pessoas desembarcando ao longo de 3,2 mil viagens, aproximadamente. Já as regiões sul e norte registraram quantidades menores de pessoas cativas desembarcando, um total de 49.044 pessoas. Dessas, 6,5 mil chegaram pelo sul do país em apenas 14 viagens.
Você pode utilizar o código dessa análise para criar seus próprios recorte. Todos os códigos das análises que publicamos estão disponíveis em nossoGitHub.
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Co-gerente do projeto SlaveVoyages e professor de história na Rice University
Quem pesquisa questões históricas, como a escravidão, precisa dedicar muito tempo para encontrar boas fontes e documentos que tratam sobre o assunto. O projeto SlaveVoyages conseguiu encurtar esse tempo ao criar um único conjunto de dados de múltiplas fontes referentes a viagens transatlânticas do tráfico escravagista, resultado de várias décadas de pesquisas independentes e colaborativas, com base em dados encontrados em bibliotecas e arquivos de todo o mundo atlântico.
Hoje conversamos com o Dr. Daniel B. Domingues da Silva, co-gerente do projeto, para entender melhor a importância dessa iniciativa e o processo de organização dessa quantidade impressionante de informações. Daniel é também professor associado de história na Rice University e pesquisa a história do tráfico de pessoas escravizadas da África Centro-Ocidental.
A plataforma SlaveVoyages reúne uma quantidade impressionante de dados sobre o Tráfico Transatlântico de pessoas escravizadas, compilados pelo trabalho de diversos pesquisadores(as) ao redor do mundo. Além da disponibilização, a plataforma traz mais acessibilidade a esses registros através de visualizações interativas e planos de aulas elaborados com os dados. Como você avalia a importância do acesso a essas informações para a pesquisa acadêmica e para a educação em geral?
O acesso à plataforma e os seus recursos, inclusive os planos de aula, é muito importante para a disseminação do conhecimento sobre a diáspora africana durante o período da escravidão. Ele também permite aos pesquisadores de vários países a avançarem nas suas respectivas pesquisas, contribuindo dessa maneira para ampliar a nossa compreensão sobre um dos períodos mais complexos da história da humanidade.
A iniciativa também abre espaço para que usuários colaborem com dados e com correções nas informações da plataforma. De acordo com o site, são mais de 80 colaboradores oficiais de dados. Qual a importância do caráter colaborativo do projeto para a construção e manutenção desses grandes bancos de dados?
A colaboração entre os pesquisadores envolvidos no projeto, além das contribuições de dados que recebemos de outros pesquisadores e estudantes localizados ao redor do mundo, desempenha um papel fundamental na manutenção e expansão da base de dados. É virtualmente impossível que apenas uma pessoa saiba todos os detalhes sobre a base e a arquitetura e engenharia digital por trás dela. Além disso, o comércio de escravizados foi uma atividade internacional. Traços dele encontram-se atualmente dispersos em diferentes línguas nos mais diversos países do mundo.
Você poderia contar um pouco sobre o processo de organização dos dados da plataforma para resolver problemas de diferentes definições de variáveis e/ou dupla contagem nos bancos de dados organizados na plataforma?
A unidade básica da plataforma consiste na viagem escravista. Cada viagem ganha um número único de identidade. Uma vez que privilegiamos fontes seriadas, o risco de dupla-contagem é baixo. De todo modo, à medida que vamos preenchendo as lacunas de cada viagem, comparamos umas com as outras. Se encontramos registros de viagens idênticos, nós combinamos seus dados a fim de formar apenas um registro de viagem.
💡 Pra ficar ainda mais fácil
Qual é a quantidade de carros e motocicletas aí na sua cidade? Você pode usar a consulta abaixo para descobrir. Ela combina os dados de Estatísticas de Frota de Veículos do Brasil, disponibilizados pelo Ministério da Infraestrutura, e nosso Diretório de Municípios. Você só precisa copiar a consulta e adicionar o nome do seu município, o ano e o mês.
Precisa de uma ajuda para começar a analisar dados com SQL? Preparamos um tutorial com os primeiros passos em nosso canal do YouTube. Confira.
📌 O que rolou esse mês
O Segredo é fazer a pergunta certa | Já se sentiu procurando uma agulha no palheiro na hora de selecionar os dados que você precisa? Nós preparamos um vídeo curto para mostrar como você pode usar o comando WHERE para fazer uma pergunta assertiva e ir direto aos dados relevantes para sua análise. Confira poraqui.
Dados da ESTBAN | Temos uma novidade quente para quem pesquisa finanças no Brasil. Os dados da Estatística Bancária Mensal (ESTBAN) já estão tratados, atualizados automaticamente e prontíssimos para sua análise na BD. Já acessee comece a explorar.
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📡No radar
Curso de Jornalismo Independente | Estão abertas as inscrições para o 1º módulo do curso online e gratuito “Jornalismo Independente: Como desenvolver projetos jornalísticos sustentáveis”. O curso é realizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) , com apoio da Meta, e será dividido em 3 módulos independentes. Faça sua inscrição por aqui.
Comissão de Transparência do Rio | O Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) julgou procedente a denúncia da Transparência Internacional - Brasil (TI) e de membros do Fórum de Direito de Acesso à Informações Públicassobre a inoperância da Comissão Mista de Transparência do estado. A partir da denúncia, o TCE-RJ determinou o cumprimento do regimento interno e do calendário de reuniões da comissão. Veja mais.
Portal da Transparência | A Controladoria Geral da União lançou uma pesquisa sobre perfil e experiência do usuário para melhorar o Portal da Transparência do Governo Federal. Hoje é o último dia para responder. Acesse por aqui.
🌎 Databasers
Gustavo de Freitas Bevilaqua, pós-graduando em Data Science and Analytics na ESALQ/USP, usou os microdados do INEP e do Censo Escolar de 2022 pela BD para criar um painel incrível com informações de matrículas de alunos com deficiência no ensino regular e na educação especial em todos os municípios do país . Confira e ajude o compartilhar o trabalho desse databaser!